Tuesday, January 30, 2007

A Demanda


Um dia destes fui buscar ao alto de um armário, por baixo de umas caixas que estavam por detrás de sacas cheias de coisas de arrumação adiada, um molhinho de folhas, que apesar de desordenadas e gastas, permaneciam dentro de umas pastas grossas de cartão, onde sempre estiveram e onde eu as tinha deixado afinal.
Tirei-lhes um pouco a poeira, era afinal essa a minha de manda, e desfolhando-as uma a uma, a mente deu uns quantos passos para trás, e senti no ar a mesma poeira, também esta acumulada em pastas, pastas de massa cinzenta feitas, encerradas umas por detrás de outras, empilhadas em organizado desalinho numa estranha caixa, forrada a cabelo.E foi no meio desta empoeirada busca que me reencontrei, nas memórias de coisas que fiz, que julgava esquecidas, mas que estavam apenas guardadas em desalinho e adiada recordação, no sítio onde, também elas, tinham ficado afinal.Lembrei-me da tua mão firme, mão de certezas feitas, que não precisou nunca de lápis e borracha para definir o seu traço, traço negro e fino de um contador de histórias, amostrador de sonhos, de visões claras e transparentes.
Recordei bons momentos, só houvera desses, e pensei em que raio de coisas nos leva, cada um de nós, a deixar de fazer cada uma das coisas que sabemos fazer bem, e que além do mais tiramos tremendo prazer pessoal, puro gozo.Mais que saber a resposta à pergunta, ao porquê, de deixarmos de fazer o gosto ao mais puro prazer, ao gozo de criar com as nossas próprias mãos, deixei ficar em aberto a sugestão, que pode ser ao mesmo tempo uma demanda.Foi por isso que um dia, um dia qualquer, e a propósito de quase nada, te deixei num embrulho, algumas folhas de papel, e nelas contida uma sugestão, a de deixares a tua mão empurrar a caneta sobre elas, seguindo o rumo que te ditar a fornalha crepitante das ideias.
Vais ver que ficas admirado com o que ainda tens dentro de ti.