Tuesday, August 30, 2011

As férias...





Tanto estou a pensar no que significam as férias que, constato, chegaram ao fim.
Todos nós já nos demos alguma vez conta disso, embora alguns, quiçá, mais lerdos, apenas durante a leitura desta mensagem, outros ainda 15 dias depois.
As férias valem o mesmo para mim, independentemente da altura do ano e da sua duração, o importante é mesmo o estar de férias. Mas o Verão, ou pelo menos o tempo quente quanto baste, obedece a alguns rituais que, me confesso, gosto.


Admito gostar de um belo mergulho nas águas gélidas das praias que ficam nos arrebaldes do Velho Burgo.

Gosto de apreciar com os sensores do meu apêndice nasal as nuances do cheiro da água salgada misturado com aromas vários, a protectores solares e óleos bronzeadores, sempre sobrepostos pelo bemfasejo e milagreiro iodo que, antigamente, muito se recomendava às tenras criancinhas, com eu próprio, que também já o fui, e lá ia também , Verão ou Inverno, a banhos para Francelos e Miramar, ou simplesmente inalar a maresia.

Admito ter quase fetiche, pela reacção contrastante do corpo esturricado por horas a fio debaixo da radiação atómica, e mergulhado de supetão nos 17 graus do meio líquido. É algo de que não prescindo e que não troco por outras paragens mais cálidas, onde a água não cheira não sabe e não sente a mar.

Revejo-me no sossego de descançar o esqueleto em cima de uma cama feita de grãos da melhor sílica nacional e sentirmo-nos embalar pelo massajar do Vento Norte enquanto somos afagados pelos dedos radiosos da anã branca à qual demos um nome tão simplório que nem o vou pronunciar.
Gosto de me deixar sucumbir, sentir os olhos fecharem-se como se algo os tivesse forçado e, nesse momento então conseguimos ouvir e, mais importante do que isso, perceber, a cantiga do mar enrola na areia ... O que ele diz, ninguém sabe, não importa para o caso, o que importa mesmo é ouvir as imagens que ele nos transmite, desde a alvorada dos tempos, num choro repetitivamente diferente a cada enrolar desmaidado na praia. Esse escutar em silêncio, do ribombar de tonalidades diversas, só interrrompido pelo cantar alegre e atrevido de uma mulher de carnes gordas tisnadas de castanho e cujo pregão fala de uma sogra palradora cuja língua ela vende, já devidamente enrolada e ensacada, em molhos de seis, mas « leve uma dúzia freguesa que é mais em conta». Pipocas, diz o seu pregão que também trás, mas é pela sogra linguaruda que as pessoas reclamam querer.
O tempo, esse maluco frenético, vai marcando as horas no relógio e os dias no calendário, e entre os banhos e a toalha vai-se temperando em poucas semans uma cor que se lamenta ter perdido a caminho do Inverno, e outros quantos meses depois, de desesperada ânsia, se tenta retomar o tom, para de novo começar tudo outra vez.
Mas agora que escrevo isto, já se contam as horas, depois os minutos, depois os segundos, numa contagem decrescente de "Canavralescos" contornos até ao tão indesejado momento que da partida. Até para o ano.


No ar ficam as promessas feitas do não falhar todos os fins de semana enquanto o tempo se mostrar de feição para a praia, promessa que poucas ou nenhumas vezes se irá cumprir. Fica-nos então a pele corada, enquanto durar, e as fotos dos mergulhos mais ou menos acrobáticos e das saídas com as algas na cabeça e o corpo forrado às evidências de que vivemos na era do petróleo, todas registadas com o telemóvel. Desfocada, desfocada, desfocada...
E as memórias, nítidas, essas ficam na alembradura, ou na transmissão verbal, esta última de contornos anedóticos e de discurso notóriamente vernáculo, onde se empolam as peripécias, as conquistas e as desgraças acontecidas durante as férias.
As lembranças são sempre muitas, e a mim fica-me sempre na retina as maminhas ao léu que por aí vi; os míudos forrados a Nívea (azul) e depois cobertos de areia quais croquetes; aquele pai que é alegremente enterrado vivo na areia pelos filhos; as excursões de gentes romeiras do campo que vão demolhar os joanetes até à rebentação, eles de chapéu e arregaçadas calças pretas, até ao joelho, elas de saia preta longa quase até à sola dos sapatos, de lenço na cabeça e guarda chuva aberto da mesma côr; gente gorda tantas vezes disforme que insiste na falta de decoro ou pudor de mostrar todo o corpo; putos que choram gelados caidos na areia ou gritam quando os pais insistem na banhoca; gente irritada com tudo, outros, que se contentam com o estar ali; num sem fim de cenários coloridos e também, alguns, grotescamente reais.


Que saudades, ainda daqui não saí, e que pena, logo agora que estava a começar a ganhar uma ligeira corzinha, já quase se notava a marca dos calções de banho.

Pode ser para que o ano consiga estar a banhos aqui, ou outro local qualquer. Daqui até lá, vou voltando aqui, em dias de chuva, frio ou de calor, sentir a mesma maresia a entrar-me no corpo e a preencher-me a Alma.